segunda-feira, 26 de abril de 2010

Bárbaro (Texto-convite para o próximo show da Trupe, dia 7 de maio, lançamento do novo CD, "Bárbaro").

É preciso quebrar as paredes da consciência, e também da nossa casa. Gritar. Chutar mesas e baldes que estiverem pela frente. Comunicar-se com os mortos, para tirar-lhes tudo que tiverem de bom. Falar em línguas, a exemplo dos pais-de-santo, e também dos doentes mentais. Isso porque a consciência anda matando. Disparos silenciosos de metralhadora giratória pelas ruas de São Paulo. Quem sabe por onde andam esses assassinos? Esses matadores, derramando sangue de corpos frágeis, de carnes perdidas, ambulantes, adolescentes trombando, e caindo, nas esquinas; alguém sabe quem está no gatilho? Assassinos filhos de uma puta! Perfurando corpos o tempo inteiro, provocando estragos irrecuperáveis no meio da multidão. Mas há quem se levante, aqui e ali, embora haja pessoas gravemente feridas que agonizam à espera da morte. Sim, há quem grite, e se erga, vamos, há quem diga, há quem diga na linguagem do corpo, linguagem-corpo, vocábulos que tudo significam mas não significam nada, glossolalias, como ouvi o Willer dizer nesta semana, uma linguagem foda que recusa toda espécie de linguagem, vocês têm que ver isso! Na verdade, ouvir. Esses que se levantam, que se rebelam, que a princípio mortos-vivos, depois em alerta, só falam glossolalias, a linguagem-invenção, à maneira de Kerouac, “Uivo” de Ginsberg, a fala dos doentes mentais, do milagre de Pentecostes – revelações divinas, incompreensíveis –, dos pais-de-santo do candomblé (da mãe Dô), a língua dos mortos, desconhecida. Quem se levanta não fala, na realidade urra! UUUU! ÊÊÊÊÊ! AAAA! O sentido é o de menos. Porque o ataque é o mais importante. O Guto é gutural, nunca havia reparado... Por falar nisso, gostei da peça do Guto e da Asto: pouco verbo; no geral, uivos, urros, upas, ulas, nos encontros, nos desenlaces, do cotidiano. “A hora em que não sabíamos nada uns dos outros”, em pleno Parque da Luz. Linguagem dos bêbados. Sim, prefiro a linguagem dos bêbados! Explosão do significado, que atira estilhaços cortantes para tudo quanto é lado, um horror de estouro: oh! Quebremos! Plum! Plá! Plá quem diz muito é o Galo. Plá! Então está feito. O ganido do Capita através do telefone: IIIIIIII! Cuidado, está no cio! Aliás, espero que o sexo role solto no próximo dia 7, e gritos de prazer sejam ouvidos pelo salão, além da música cheia de alma da Trupe. Trupe dos Prazeres. Não precisa verbalizar. Só os estalos dos beijos, bicho! Ou sentir o abraço de almofada do Gom Gom. Can! Can can! Can can can! Ah! Viu só, Gom Gom? A nossa geração arrastando-se semi-defunta pelas ruas e nós aqui, na maior das viagens, falando coisas à toa. Tudo bobagem. Vamos à mesa? Comer os mortos. A Tropicália. Comer um lanche cheio de sangue de alegria e vida. Quem vem? A Trupe está convidando. Fagocitose. Células no processo de envolvimento de partículas sólidas. Nós comendo. Fagocitando. Comendo Itamar, Chico, Caetano. Bem no rabo. Comendo o Piva também. A nossa geração precisa se alimentar melhor. Passa o dia todo perambulando na Paulista, de barriga vazia, à procura de emprego, ou seguindo ordens. Rimbaud. Artaud. E sobretudo o Oswald, que foi quem trouxe esse papo de canibalismo aqui pro Brasil. Façamos carnaval com os vivos! Levantando defunto! Felipinho Caos e seu baixo, Rafinha e Guto ribombando, bombas pisadas, Bastos e suas ondas elétricas orgásticas, piso partido, pá pá pá pá... Um fogueteiro só declamado pela Ciça, em transe, quebrando as paredes. A Leila ajudando, com sua marreta infernal. E o Cabelinho, enquanto isso, chacoalhando o bombril, ao mesmo tempo em que a Julia vai abrindo sua bocona punk rock, putz!, maior grito, engolindo as almas dos garotinhos da primeira fileira! Vai! Vamos lanchar antes que tudo apodreça. Bárbaro. Sair do armário. Fugir de casa. Quebrar as paredes. O caralho. Bárbaro. Sempre é bom. Senão embolora, como dizia o Leminski, arauto da desordem. Vamos à mesa! Seguindo os sopros do Mumu e do Ray, indicando o caminho. Vamos enquanto é tempo. E nos encontramos no dia 7.

4 comentários:

  1. Gosto muito desse pessoal cara!

    É isso mesmo cara!!! ANTROPOFAGIA RENOVADA, TOTAL!!!

    Eu ainda conheço essa sua turma!

    Abraço,

    Vina
    PS: não, não tenho blog. hehe

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  2. Ô cara, desculpa pelo excesso da palavra cara na mensagem acima, cara! rs

    Até!

    Ass: Um Cara

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  3. bicho, voltei à blogosfera.

    contemplaromundo.blogspot.com

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