terça-feira, 4 de agosto de 2009

Chicholina

Saímos do baile abraçadinhos, e da calçada ainda se ouvia a gafieira do clube de tênis. Levei-a para o carro. Ao volante, meio bêbado, disse todas as minhas vantagens, as que tenho e as que imagino que tenho. Pintei-me bem, como se fosse um artista experiente, com pincel grosso e traços precisos. E ela gostou. Perguntou-me se eu era tudo aquilo mesmo que estava falando, e respondi que tudo e mais um pouco. Ela sorriu. Chegamos em casa.
Logo que entramos, notei que estava um pouco tímida, mas a conduzi rapidamente para o quarto, onde pudesse se sentir mais à vontade, também porque fiquei com receio de acordar a minha mãe. De manhã, pensei, não vai ter jeito, não tem como escapar dos olhos da dona da casa. Mas no meu quarto, sou eu que mando. Mostrei-lhe a cama, ela deitou. Quando comecei a beijá-la de mansinho, propondo uma noite de carícias – já que estava realmente debilitado pela vodca – ela me agarrou com violência. Rolamos amassados em cima do edredom, sem tirar os sapatos e com a luz do quarto acesa. Ela me mordia como se eu fosse uma coxa de frango e me esganava como faria o Fantomas no Tedy Boy Marino, da luta-livre. Caramba, não precisa ser tão rápido, senão a gente se mata antes mesmo de tirar a roupa! Mas quem disse que ela parava: Carolina é louca. Começou a me lamber os ouvidos, mordeu a cartilagem, pensei que fosse me arrancar alguma parte. Depois veio me arranhar as costas, apertar minha bunda, minha coxa, calma lá! Aquilo parecia um tanque de guerra desgovernado em plena cidade grande, derrubando postes, cabines telefônicas, invadindo prédios públicos... O que mais faria, depois de me tapar a boca e de quase me rasgar os lábios? Nossa, aquilo para mim estava demais. Carolina, devagar... eu lhe disse. Mas acho que nem ouviu. Quis tirar minha cueca, eu recuei. Não podia com aquilo. É querer que um kart aposte corrida com um fórmula 1. Estava sedento, mole de bêbado, morrendo de preguiça, dor cabeça, com os olhos baixos, à procura de carícias suaves ou mesmo uma noite de sono. Na minha frente, uma verdadeira pantera indomável, uma selvagem, que desconhece regras, que não sabe o que é razão. Levantei-me da cama. Ela me perguntou se estava tudo bem, e eu disse que sim.
Quando me distanciei, no entanto, analisei suas qualidades: coxas grossas, belos lábios, uma graça, braços finos, dedos delicados, seios grandes. Não, não poderia perder uma oportunidade dessa! Talvez se lhe tirasse o sutiã poderia me empolgar um pouco, quem sabe... Seus seios encheram-me as mãos. Carolina é louca, mas é gostosa, pensei. Enquanto lhe acariciava os mamilos, ela aquietou-se, como se fosse atingida por um dardo tranquilizante. Agora era só descer minhas mãos ao longo de seu corpo, para o umbigo, o ventre, apalpar-lhe as virilhas... Mas quem disse que meu corpo respondia? Carolina, coitada, agora estava mansinha, do jeito que eu queria, de olhos fechados, pernas abertas, em minha própria cama, terreiro do galo. O que quero dizer é que tudo estava a meu favor: menos eu. Precisava de tesão urgentemente!
Aproveitei que ela estava de olhos fechados, disse-lhe no ouvidinho que precisava ir ao banheiro, mas que já estava de volta: um pé lá outro cá. Mas a verdade é que desejava sumir, sumir de minha própria casa. Que ideia trazer uma menina dessas para cama justo num dia em que estou bêbado e indisposto! Deveria ter sido mais humilde, pedir o telefone, depois marcar de ir ao cinema... Às vezes essas cerimônias são necessárias, pois preparam o ânimo e dão tempo para a gente esperar o momento certo. Fui apressadinho, não medi minhas condições físicas; como sempre, achei que podia tudo, e agora estava lá no quarto aquele tremendo pepino me esperando. E nada do meu subir!
Tranquei-me no banheiro e apelei para a água fria. Acorda, rapaz! Molhei o rosto, a nuca, o pescoço. Tinha alguma coisa de errado comigo? Enquanto me encarava no espelho, lembrei-me da época em que meu pai morava em casa e, uma vez, tomei um susto quando achei uma cartelinha de Viagra na gaveta do seu criado-mudo. Aquilo para mim era o fim da picada, como assim precisar de Viagra?! Na frente de uma mulher nua é impossível não sentir tesão. Muitas vezes quando estou no ônibus, ou mesmo andando na rua, só de olhar para uma bunda já fico excitado! Isso nunca havia me acontecido antes. Geralmente ocorre o contrário, em vez de brigar para ter tesão, tenho de lutar para freá-lo, senão acaba rápido demais. Essa história de brochar é coisa de velho. Desespero: Carolina tinha ficado no quarto. Precisava rapidamente de uma injeção de vida. O que fosse me faria feliz. Mas quando comecei a buscar nas gavetas do banheiro a cartelinha de Viagra – quem sabe não havia sido esquecida alguma pílula na época da separação? –, tomei vergonha na cara e dei-me dois tapas no rosto. Isso não! Tenho princípios. Mesmo que ninguém soubesse, não me perdoaria. Preferiria encarar a minha falta de tesão, o meu próprio fracasso, a tomar meia pílula que fosse.
Foi quando me lembrei das minhas revistas antigas que ficam no fundo da gaveta do armário do banheiro. Entre elas, há desde raridades, como a Playboy da Fogueteira do Maracanã, até edições recentes, como a da Tiazinha e da Mel Lisboa. Já faz um tempinho que parei de comprar essas coisas, mas nunca perdi o interesse. Minha mãe jogou a maioria fora, disse que sem vergonhice não entra em casa, mas não impediu que eu guardasse as de valor sentimental. Como um soldadinho de chumbo da infância, uma camiseta que já não serve, conservo essas revistas porque as considero recordações preciosas dos meus primeiros amores. Ah, a Chicholina! Não é da minha época, mas sempre amei a Chicholina. Ela nunca me decepcionou. Está aí uma coisa interessante: será que ainda existe essa revista da Chicholina? Procurei no meio da poeira, Vera Fischer, Sheila Carvalho, Globeleza, e eis que lá no fundo, quase esquecida, estava a minha musa dos 12 anos, a branquela mais peituda que o mundo já conheceu. Só pensava na Carolina me esperando. Folheava a revista como se voltasse uns 10 anos no tempo. Lembrava-me de tudo: da foto de apresentação, do sorriso de canto de boca, do batom cor-de-rosa. Mas o melhor estava no pôster extra do meio da revista, desses que se abrem em três. Aquilo é carne para 10 gerações, um exagero! Chicholina sempre vai ser Chicholina. Ali não tinha Viagra, nenhum artifício que me desse tanto vigor. Tirei a camiseta. Meu corpo enfim respondia!
Quando voltei ao quarto e vi Carolina de bruços, pensei que estivesse dormindo. Perguntou por que eu tinha demorado tanto, não respondi. Fechando os olhos, apalpei-lhe os seios: minha Chicholina! Pedi para ela se deitar de lado, que nem o pôster da revista; ela obedeceu. Rimos. Gritei de novo: minha Chicholina, e ela me chamou de bêbado safado.

São Paulo, 9 de julho de 2006.